domingo, 6 de dezembro de 2009

.: Dia vinte e oito :.

Sabe, eu um dia vou me cansar disso tudo. De toda essa pressão que não é minha e não me deixa ser grande como sempre fui, esse todo que me decepa qualquer extensão, me mastiga qualquer devaneio, me faz um pedaço maldito de carne, maldito tantas vezes quantas possam ser amaldiçoadas as carnes de uma pessoa como eu. Mais ou menos assim que me maltrato. Sei de meu aleijão sentimental e nem por isso saio esmagando todos com meus abraços, nem esquecendo todos com meus olhares perdidos, nem me mostrando mais do que eu possa ser, nem nada, nem mais, nem menos, nem termo nenhum: um ponto no meio dos pontos, um paradoxo.
Sinto que ainda posso muito, e nesses metafóricos ou seja lá o que forem vinte e oito dias me desmanchei como pude, me contorci, aprendi, enfrentei, cantei muito e estive de pé, sem dormir, sem comer, sem descanso, sem espaço... a turbulência me faz fixa no solo, mas a intensidade dos fatos me faz muito perto de tudo o que acontece. Não sinto o precisar, de maneira nenhuma.
Gostaria de me perder com ternura, só isso, me perder com ternura sempre, por que se isso faltar em meu caminho sinto que estarei no caminho errado, com o tempo perdido e estraçalhado em um lençol qualquer. E eu não quero me ver assim.

domingo, 22 de novembro de 2009

.: Dia vinte e sete :.

Vinte e sete dias. Um cometa me atingiu, e nada me faz mais triste. Sou como o rio Parnaíba de Da Costa e Silva.

O silêncio alimenta minha bravura.

sábado, 24 de outubro de 2009

.: Dia Vinte e Seis :.

O mar me devolve as perguntas que lanço a ele. O dia me persegue e se esvai em suor e palavras. As poesias me nutrem, aliviam e perturbam. O querer me abre os olhos todos os dias de manhã. A dor me faz viva, a carne me faz fraca, o sangue me jorra do juízo a cada palavra desnecessária. Existem palavras desnecessárias?
Caminhando como sempre gosto de fazer, me retiro da sala de jantar. O estômago dói a falta de um café da manhã, os olhos reclamam sono. Me deito. As pernas reclamam a falta das tuas. O frio não acontece, é dia já, e como todos os outros é quente e incômodo. Incômodo. Sufocante. Desesperador. Eu que já não sou muito de esperar fico me debatendo com as pernas para cima, uma maneira de achar que estou saindo do lugar. Me evolua por favor. A minha história acontece, perdição, a reescrevo todos os dias, o que não sou, o que não existiria nem em outras encarnações. Seria eu um reprojeto de um anterior que não deu certo? Esquece... estou delirante de sono.
Minhas personagens são todas as mesmas solitárias, apaixonadas, um tanto perdidas, devastadoras marias de manhã cedo, com cara de sono e um orgulho sem fim: se sentem perfeitas e completas em suas significâncias especializadas. São únicas e limitadas, e são felizes de serem assim. Às vezes são discretas, e quase sempre sofrem de estarem vivas.
Neste momento detenho um pequeno riso no canto do rosto:

Sofrer o estar vivo. Ha! Mais comum do que se imagina. Menos simples do que se espera.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

.: Dia Vinte e Cinco :.

Vinte e cinco dias. Penso em parar quando completar um mês, só não decidi ainda se será um mês de trinta ou trinta e um dias. Nenhum desses meus dias passou calmo e constante, nenhum deles se mostrou comum. Não interessa...
Sabe, eu prefiro meus longos cabelos negros e indecisos, meus longos pensamentos inconstantes, minha natureza densa, meu esperar macio depois de tantos turbilhões. Me coloco diante do mar, e ele me repete os enunciados que lanço deliciosamente em sua direção, assim, para me ver livre. Minha cabeça dói muito, creio que seja uma doença, ou uma má notícia que se aproxima. Uma não anula a outra. Hoje é um dia indiscutivelmente comum, e me lanço na conversa sozinha, calma, como quem vaga à procura de.
Vou me retirar com minha precisão. Precisão, leia-se precisar.

Au revoir!

domingo, 27 de setembro de 2009

.: Dia Vinte e Cuatro :.

Você está fora, e você sabe que está aí fora, e não se importa, nem um pouco. Fora é o tipo da coisa que expressão nenhuma equivale, acho que se eu disser que você não se entrega é melhor caminho, creio que sim. Abro as portas, as janelas, as pernas e nada, você continua aí fora, olhando para cima, um olhar perdido, eu indignada chamaria de imundo, de doentio, febril. Te conheci assim, fora. Aí vem você me falar de hesitar e tal, e eu nem ligo por que ando muito entorpecida para isso, vou fingindo que não te vejo aí fora, vou cavalgando em minha vida, dentro da roda, mais comum que os mais comuns que existem, acho que é assim que sou vista. Mais ou menos assim. Saio e te pego pela mão, você me olha e continua aí fora, cheio de si, mais dependente que eu, e vai ficando pequeno, e isso pois está longe demais... vai diminuindo, longe, pequenininho. A pose que você faz me inebria, fica parado, todo torto, olhando para cima. Eu sei o que é, você vive esperando, mas isso eu não sei o que é, nem o lance de esperar, nem o que é que você espera. Vou ficar no hoje, meu melhor dia, sem esperar. Acho isso de esperar patético, já disse, pathos doentio... paixão.


Hoje não haverá uma frase de efeito no final. Que se foda!

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

.: Dia Vinte e Três :.

O ufanismo me irrita tanto que quero levar uma tijolada na janela do ônibus. Quero que furiosos invadam um evento da high society e, nus, recitem poesias dramáticas e sangrentas. Imagino minha cidade em chamas, ela que já é quente e ácida, mas ainda assim quero a dança das labaredas a piorar o inferno. Ela é quase assim. Um inferno. Uma loba no cio. Uma cicatriz na Terra. O real está em toda parte e não posso negar os universos que transito dentro dele, sou um elo de meu tempo com os tempos que fotografo nestes textos, sou um desses universos. Reverbero. Universo. Verso bem no meio.
Estive a pensar no amor, nos desiludidos que breve se tornarão caveiras inexpressivas. O sistema me consome hoje e fico cruel na carnificina que se tornam meus dizeres. São ensaios. Vivo mais tempo ensaiando que vivendo, por isso me irrito neste instante. Perdição.
Vamos subir, subamos, sobreviver e cair, para depois desejar eternamente o que não foi, e esquecer do que existe. Conjugar verbos em descrições eternas, maltratar dias e noites com lamúrias propositais e constrangedoras, sejamos! Hoje me canso dos que desejam o mais além do que não foi. Me canso dos que saudosistas descrevem dias que não existem, amores que sucumbem ao real.
Sinceramente, que os dois pés descalços no chão, as mãos cheias de terra, a ferida sarando à fortes lambidas, os calcanhares rachados, os calos nos dedos, os olhos enrugados e sempre olhando para frente triunfem, por mais que não sejam líricos e perfeitos, por mais que não possam colher as flores surreais, por mais que não toquem a metafísica das coisas.

Não me perco por dois minutos para não me achar no infinito.

domingo, 20 de setembro de 2009

.: Dia vinte e dois :.

Vinte e dois dias e ainda aparento este cansaço descomunal para minha frágil compleição física. Sou uma mulher magra, mesmo que em muitos aspectos pareça enorme... Tem coisas que permanecerão estagnadas e despretenciosamente machucando minha cabeça e meu coração... a distração é minha melhor companhia, e as luzes da cidade vão respirar alto comigo, junto com a batida extrema de meu coração.
Notei um dia desses que sou frágil. Foi a morte quem me disse isso, assoprando um vento frio em meus calcanhares numa noite de quarta feira, uma rua escura e uma cidade que me destrói. Eu pude sentir aquela força sem direção me alcançar para dizer que não devo esquecê-la, que não posso encarar tamanha loucura, que não sou nada nem ninguém perto dela. Nem o amor seria assim. Invenção moderna que é.
Acho que perdi um pouco do rumo, e escrevo desastrosamente jogando meu sangue por toda parte. Nos confins de lugar nenhum. Ânsia de infinito.
Estou seriamente abalada, se é que existe um abalo não sério. Meus alicerces se comprometeram a não cair, mesmo depois de devastações tantas. Vou me levantar desta cadeira, meio tonta como estou, e vou caminhar em meio ao fogo que lá fora habita.

Depois de todas as tempestades e naufrágios o que fica de mim em mim é cada vez mais essencial e verdadeiro. C. F. A.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

.: Dia vinte e um :.

A vontade que tenho é de arrancar até a última víscera, tudo muito proparoxítono e sangrento, sem vergonha de existir, sou o que mais arrepia a alma dos pequenos, sou um grito desesperado a cada instante. Sou assim de perto.
Me levantei felina, como um solo de guitarra de Eric Clapton, e fui ser irresponsável em casa. A noite foi de longas demandas, doze trabalhos de Hércules, todos perdidos no fim aos meus olhos inchados de sono e desidratação. Me estico, saio andando no vento fresco da manhã ensolarada de minha cidade, sou mais alta que os pensamentos preconceituosos, mais alta que a fumaça dos fumantes dragões modernos, mais alta que as cervejas derramadas, maior que o calor que sobe do asfalto... Caminhei de frente, peito dilascerado e feliz de ser meu, só meus pedaços, em brasa sempre. Fito as árvores, o vento ainda sopra a meu favor e por mais que eu queira descrever uma cena onde acontece tudo ao mesmo tempo, os elementos só aparecerão um após o outro, aos poucos e surgindo a cada linha que escrevo, no fim, você que me lê, considere toda a cena, sinta tudo ao mesmo tempo, que é assim que quero mostrar e ferir.
Golpes e mais golpes em vão, pernas ao vento, esperneio, continuo caminhando.
Agora ando mais lentamente, as explosões passaram ao meu redor, e dentro de mim está uma calma incômoda, chutes por dentro, mas sem o contentamento de vida, são violentos e dolorosos...
Estou desagradável agora, não quero falar com quem me cumprimenta. Meu querer é agressivo e sem conveniências. Nem para mim elas existem.
Experiência poética. É o que estou fazendo agora, todo o processo documentado, toda a turbulência. Demasia, exagero, deturpação, gritaria, barulho. O irracional faz parte de mim também, não sou perfeição, nem desejo essa monotonia para meus dias. Estou possessa e os pontos surgem em meu texto, meus olhos estão doloridos, minha boca secou, minha cabeça vai explodir, explodir, explodir, explodir, não sei mais digitar essa palavra e nem palavra nenhuma, elas se tornaram sensíveis demais para o que sinto agora, e não interessa o que é sentido agora, o que interessa é a cor toda que irradiam meus olhos. Meus olhos.Inchados e caídos diante de um espelho que me reflete menor e mais magra. Magricela.
Talvez tudo caia por terra, e meu destino seja o inconstante eterno e extremista. Notas musicais que se agrupam e ferem a pele alheia. São as notas musicais do Alecrim.

Ai!

Deixa, deixa, deixa eu dizer o que penso desta vida, preciso demais desabafar!

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

.: Dia vinte :.

Vinte possivelmente é um número passivo.
Hoje o frio da noite me acompanha e envolve meus passos. Pareço um sonho, um medo e um sussurro, pareço com uma flor caída na calçada. Desapareço no esperado momento, desconheço o outro que tanto aperto em afago desesperado. Sou um paradoxo barato, que todo dia vem aqui dizer quem é. Sou uma alma alheia que todo dia vem aqui lamuriar sons perturbadores. Não interessa quem eu sou... só me debato em quem eu era, já que a todo instante as águas me levam nos rios, a todo segundo aquela outra se desfaz em fúria comovente.
Crepusculário. Todas as cores se confundem em nuvens sonolentas e a água se confunde com o céu na beira do rio. Desperto ou deito sempre com um aperto no peito, um daqueles que não explico, mas que se explicam no grito ensurdecedor que por vezes vira poesia.
Eu já disse que vou morrer? Uma fascinação eterna essa da morte certa, uma aceitação fajuta, um dizer amaldiçoado por todos que o ouvem. Ainda estou no crepusculário, sorvendo as cores feito menino que vem da corrida suado e aflito, querendo toda a água da garrafa que fica na geladeira que ele não pode abrir com o corpo quente.
Eu sei que escrevo para ser lida, e o improvável, digamos assim, é que sou livre dentro desta única limitação. Limitação que liberta o espírito e consquista as cicatrizes alheias. É assim que trabalho.
Os meus olhos pararam de repente, e acordei. Um fluxo contínuo que se quebra, um outro que se inicia, e eu nem reparei quando foi...
O martelo continua a pregar, e meus ouvidos não podem mais com isso. Quero desesperadamente gritar mais alto, quero explodir mil vezes, reconstruída explodir, quero a exatidão do solitário, e as pequenas epifanias de quem aprendeu a viver sozinho.

Nascer e morrer. Dormir e acordar. Eu sei, eu sei...

sábado, 22 de agosto de 2009

.: Dia Dez e nove :.

Hoje assumo minha alma essencialmente triste.
Todos os dias de manhã bem cedo, sobre 4 rodas e muito concreto, faço a travessia de um rio escuro e mal cheiroso. À tardinha faço um passeio ao lado de outro rio maior, mais sisudo e não menos sujo que o outro. Todos os dias eu os vejo, todos os dias eu me espanto, são paisagens de estranhamento, não são os rios de minha aldeia.
Arenoso fica o meu olhar, marejado de estar entre rios, dedicado a apreciar cada detalhe de uma visão úmida e violentada: estes são os rios de minha aldeia. Minha aldeia que cresce pantanosa e solitária, cada dia mais solitária, bem assim sozinha como o nascer e o morrer. Minh'aldeia, estimulada por socos e pontapés, criada debaixo de sol e mentira. Meu lugar.
Todos os dias eu encaro os rios como presentes, aqui e agora, como o tempo correndo e afogando os mais fracos... Todos os dias quero sentir o gosto daquela visão estarrecedora, de certo modo que me descontenta de sofrer o que sofre meu lugar.
Somos contradição, e somos um só, sem definição limitada, um só.
Meu terno ser todos os dias se retira e acompanha o fluxo daquelas águas, um rio me carrega da direita para a esquerda: quer arrancar-me o coração. No outro eu navego em direção ao beijo marítimo, e me desvio pra no outro dia renascer dentro do fluxo.
Sinto o inacabar deste texto, e a ânsia de partir agora...

Nunca são as mesmas águas. E eu nunca sou a mesma.

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

.: Dia dezoito :.

O infinito. Dia dezoito: o infinito.
Sou rica, com a licença da palavra, como um barulho de coração. Retumbante.
Tenho neste dia as mãos atadas, a dignidade corrompida pela falta de coragem, a covardia de desistir por puro cansaço, a dor de atravessar avenidas e rios querendo voltar. Voltei. Voltei pois ninguém me seguia, ninguém testemunhava minhas intempéries ou niguém precisa disso. Não há precisão. Eu acordo de estar de acordo, não de acordar, que nada mais disso vai me corroer. Hermetismo nas palavras? Não. Basta querer se jogar e se sujar de meu sangue embutido em cada fonema.
Alterações por segundo. Mutações por milésimo. Obrigações por hora. Morte todo dia.
Vou morrendo e preciso estar conformada, não posso declarar confronto armado aos vícios comuns, não posso renegar o imposto, o anti natural... é errado e ruim. Não posso. Deturpada. Cruel.
Me traz um chá? Estou com as mãos tremendo de desespero, e preciso compartilhar a minha conduta ridícula com algum outro humano. Me sinto heterônimo pessoano, desassossêgo!
Está me incomodando o fato de nem ser noite ainda... já está tudo em silêncio ao meu redor, e nem é madrugada alta e fina. Como cetim negro. Quero olhar para o céu e sentir forças ao ver o caçador astuto e forte, aquele que estampa o negrume da madrugada, e fica ali na espreita, perfurando destinos, inatingível e real. Órion.
Com mais licença ainda da palavra, quero me retirar agora. Vou abraçar escorpião e mergulhar no horizonte. Ainda assim sem jeito depois de tudo. Ainda assim me escondendo em todas as desculpas que posso para me manter inalterada, inconstante, imprevisível do jeito que a paixão permite.

Este texto deve ser lido em voz alta pela segunda ou terceira voz que mora dentro de sua cabeça.

Agradecida.

quarta-feira, 29 de julho de 2009

.: Dia dezessete :.

"Frágil – você tem tanta vontade de chorar, tanta vontade de ir embora. Para que o protejam, para que sintam falta. Tanta vontade de viajar para bem longe, romper todos os laços, sem deixar endereço. Um dia mandará um cartão-postal de algum lugar improvável. Bali, Madagascar, Sumatra. Escreverá: penso em você. Deve ser bonito, mesmo melancólico, alguém que se foi pensar em você num lugar improvável como esse. Você se comove com o que não acontece, você sente frio e medo. Parado atrás da vidraça, olhando a chuva que, aos poucos começa a passar.”

. Caio Fernando Abreu in Pequenas Epifanias.

domingo, 26 de julho de 2009

.: Dia dezesseis :.

Ah sim, o amor, reverberando através do tempo.

Me cansa a covardia das pessoas que se deparam com o real e ficam a traduzir ou desconstruir em hermetismo o que poderia ter sido. A perfeição do que não existe me corrói acidamente, me perturba violentamente, me atormenta a cada segundo. Algumas respostas eu prefiro não ouvir, coisa que me sufoca covarde também.

Lose is more than hesitate.

Acredito nesta frase pétrea. E me acabo, violentamente, pulo janelas e destruo universos. Louca, plena, exagerada. E quem se importa? Estou escrevendo este dia como quem apenas anda, e segue em frente diante do mundo igual, produto da anestesia diária. Estou escrevendo este dia como quem apenas ri, descontrolada e grande, de espírito livre, do jeitinho que nasci. Minhas ações valem mais que palavras contorcidas. Sou amor, gigantesca como sempre fui.

Lose is more than hesitate.

terça-feira, 23 de junho de 2009

.: Dia quinze :.

Ainda não encontrei o sentido. Estou cansada de abraçar e apertar até o sufocamento algo que poderia ter sido.

sexta-feira, 19 de junho de 2009

.: Dia cuatorze :.

Ja passa da meia noite e me pergunto o quanto tenho sido hermética nestas linhas mal escritas. Procurar e destruir esse maldito momento misterioso é o próximo objeto de trabalho em mente. Necessito de mais viver e menos divagar, mais lembrar que estou viva e menos resoluções por escrito que me traduzem confusa e insegura a todo instante.
Toda hora sinto dor. Toda hora, sinto nos dentes, nas pernas, na unha do dedo mínimo do pé esquerdo, na cabeça, no coração. E nunca me lembro que estou viva. Passo frio, na sala de aula, no quarto, nas chuvas, no fundo do olho eu sinto, e não me lembro que tou viva. Calor, muito e quase sempre o calor, no ônibus, na sala de jantar, na cadeira em frente ao computador, muito calor pra não me lembrar de estar viva... É que vi num filme ou em um livro, não me lembro bem, que essas sensações servem pra nos lembrar de estar vivos. Mas eu não lembro. Nunca lembro. Talvez eu não queira.
Vou te contar que estou menos lírica que anteontem, que fico aqui querendo apenas ver essas páginas extensas, e mais e mais e mais e mais mais mais... desesperadamente mais. O meu pior defeito é o medo, a pior qualidade a ironia.

Para finalizar escreva aqui uma frase de efeito. Obrigada.

.: Dia treze :.

Eu estou sentada em um bar bem organizado, com baratas e tudo o mais que eles precisam, e daqui da pra ver o céu. O horizonte carregado de metáforas... tão colorido e pesado que fico melancólica. Professora de melancolia, tal qual esse de Um apólogo , cansada de servir de agulha pr'essas linhas ordinárias!
As luzes já amarelam as ruas neste instante e eu aqui carregando um fardo estranho e impreciso, ele se derrama e escorre escada abaixo, quase sempre escorre de meus olhos. Nunca estarei sozinha o suficiente para morrer de desgosto. Nunca precisarei de tantos para que me sinta em casa, já tenho quem me basta, já possuo aquele dom. Escrevo.
Na praça do grande poeta as prostitutas se amontoam nas esquinas, na meia luz, meia roupa, meia vida... vida de merda! Fico ainda divagando das metáforas no céu, esquecida de resto de mundo, esperando alguma coisa que não virá.
Acredito na poesia do mundo, acredito na pintura do mundo, vivo a poesia e a pintura, vivo a música do mundo nos ritmos que ele decreta, e nos que eu apreendo. Quem me diz o que é certo se esbarra a cada dois minutos num muro gigantesco. É tudo tão pequeno que dói, no entanto todos preferem o pequeno, ele é aconchegante, ele dá segurança de um objetivo de vida.
Chega mais pra lá que o sangue já está quase me tocando, e eu pretendo sair daqui limpa, sem esse líquido nas mãos.
Sabe que me sinto melhor agora?
Tão inutil e bom conversar comigo.

Mais pálida e alta me levantei da cadeira imunda do bar e deixei uma poesia enrolada pela mesa.

Eu sou bem criada. Eu e minhas poesias.

terça-feira, 2 de junho de 2009

.: Dia doze :.

Os passos não são firmes e a conduta é imoral. O lixo, as horas e a dor não consomem nenhum pedaço da carne quente e sempre disponível. Sempre que se pode. Sempre que se quer. As possibilidades, de tão infinitas, deixam de caber neste verivérbio, neste vocábulo inflexível, nesta arena de pedra que é a indecisão. Elas são mais, e tudo. O corpo febril ateia fogo às imagens redutoras, e o sentido está sempre em movimento, em toda parte, em lugar nenhum, em paradoxos pobres e ansiosos de mostrar alguma coisa sem nome ou forma. Mas carregados de ansiedade, tremendo de vontade flamejante.
Meu nome é o nome de todas as mulheres, meus desejos os de todas, desejo todas, desejo de todas, iguais. Meu nome é aquele escrito na carta amassada tantas vezes, cheia de suor de mãos ansiosas, frenesi de ansiedade ou tremor de paixão, impaciência de desejo, amor. Meu nome é o mais alto grito na noite escura da noite escura, o mais forte dito nos bares cheios de amargura e separação, o mais bêbado numa boca dormente e com gosto de sangue. Eu sempre serei ela. Meu nome é o não dito para não causar constrangimento, é o queimado junto às cartas antigas, é o que estava tatuado no braço esquerdo, perto do coração e foi coberto por outras imagens abstratas e doloridas. O meu nome é o mais belo, é de flor, é o que fica na caixa de entrada de emails antigos, o meu nome é forte e eterno. Meu nome fica na profecia da cigana, no escarro do traído, na pretensão do apaixonado, no temor do cauteloso, na garganta da mulher deixada, no gemido de prazer noturno. O meu nome não pode ser dito. Eu não sou.
Dia doce: não te direi meu nome, grave meu rosto e as expressões que mais detenho ao te encarar.

quinta-feira, 21 de maio de 2009

.: Dia onze :. , epifania de uma hora dolorida

Minha loucura reside na órbita mais externa. Na constelação mais extravagante. Na poeira que nunca se acalma ao chão. A minha alquimia é real.

Levantei-me com os deveres já cumpridos. A respiração dolorida, pulmões vazios e inquietos, tudo atravessando os limites. Os fatos se afastaram e me resta relatar o sentido embutido em pequenas epifanias diárias, em pausas respiratórias brutais, em margaridas que brotam da parede fria. Os abraços. Sim. Os abraços que aguardo.

Me encontro sentada numa espera interminável, num vazio que me inquieta os dias todos, do primeiro ao décimo, e ainda continua, por mais que eu grite, por mais que eu esperneie e agrida a todos, é contínuo o vazio. Não tem cor. Não tem palavras. Só a necessidade latejando ininterrupta. Só a necessidade. Necessidade.

Sinto-me narrando um filme bem dramático e bem fotografado. Minha voz rouca dá um tom preciso de tédio e loucura. Talvez calma também. A película azulada traz frio, mesmo residindo na cidade mais quente do planeta. O frio fica assim metafórico. Nas cenas se passam os dias, meu acordar inerme, minhas horas em um sofá encarnado, meu caminhar na madrugada insone, a televisão ligada para fazer companhia, a comida nem um pouco saudável, para complementar o ar de solidão. Solidão só minha. Mesmo entre filhos e amores. Não doei esta parte de mim a ninguém.

O fim do filme não pensei ainda, incompleta como escolhi ser creio que vá ficar em aberto por tanto muito tempo, tanto, que as páginas serão poucas nas tentativas agônicas de complemento.



Aujurdui, Je suis vraiment désolé.

terça-feira, 19 de maio de 2009

.: Dia décimo :.

O que me faltam são os gritos. Sim, quero por demais que todos ouçam o que sentes.
Hoje, no décimo dia, tenho um estreito olhar pelo buraco de agulha que sustenta minh'alma. Não existe distinção entre nublado e verdadeiro, entre nós e fagulhas. Precisando de gritos, ainda, como sempre, insisto no precisar. Antes fosse precisão. Mas é antes de tudo enquanto um fosso. Fosse isso, fosse aquilo, fossem as necessidades que alimento, sem nem pensar e pesar os depois, os antes, os ésses e os érres.
O que me sustenta é amor. Coisa mais comum do mundo é o amor sustentar as pessoas, é todo mundo dizer isso.
Tô cansada de falar de mim. De me deter em cima dos mundos, sufocando.

Tô largada no chão.
Me levanta?

sexta-feira, 15 de maio de 2009

.: Dia nono :.

tenho vontade de te gritar poesias Mas as promessas de amanhãs púrpuras me fazem regredir o ato Descanso Descaso Do meu sono Do teu sorriso conformado Do meu acaso Talvez eu me lembre os versos certos e trabalhe sem descanso

sexta-feira, 1 de maio de 2009

.: Dia oitavo:.

Alguns dias passam vagarosamente e sempre tem uma estupidez na esquina, ali, à espreita, esperando a hora certa de agarrar os pensamentos perdidos e transformá-los em loucura. Hoje é um desses dias em que tudo se contorce, se entrelaça em divagações estupendas enquanto que na televisão a gripe suína e a natureza aguardam a salvação. Intervenção divina, xadrez... e eu aqui nos meus trocentos pensamentos internos, nesse acordar para dentro todo dia, o dia todo, bem egoísta, achando que a humanidade é quem precisa realmente de salvação. Eu sonhei o dia todo, e agora estou com dor de cabeça, com os olhos inchados e pesados, as mãos doloridas... é que sempre apóio a cabeça contra elas.
Não vou falar de amores hoje.
Não queria nem ter escrito isso na verdade, mas é que fica além de meu querer, além do além, e antes do antes.

No mais:

Bonne nuit et bonne chance!

segunda-feira, 20 de abril de 2009

.: Dia sétimo :.

María, María... (em tom de advertência) foi o que ouvi hoje ao condensar diversas histórias do passado. Condensado de lágrimas, como sempre.
Hoje fecho uma semana, e nunca falei de minha história pra ninguém..., não gostaria, visto que não ocorreu nada de extremamente emocionante comigo que deva ser relatado em tom dramático ou abissal.
Nasci de uma epifania, uma risada estrondosa e uma lágrima escondida. Minha mãe não esteve presente em meu desenvolver, cresci meio sozinha. Queria contar que cresci entre tigres selvagens que me ensinaram tudo sobre relacionar-se com o mundo... mas deixo meu tigre calado, em mansidão precisa. No mais fui sendo espelho de gritos confusos de uma personalidade que se mostra mais do que deveria, menos do que necessita, e de vez em sempre causa escândalos, abalos e outras definições impactantes de fatos catastróficos. Sou uma sombra forte, em aquarela deliciosa, sou uma cor: lilás, um cheiro de orvalho do mar, uma música do Nat King Cole e umas entradas para o cinema mudo.
Não deveria ter dito tanto, apesar de me mostrar inteira e nervosa com dedos suados, não sou o que descrevo e reescrevo por aqui. Sou bem maior, coisas de luz: acesa a luz, ela não cabe mais em lugar nenhum, nem no quarto, nem na sala... lugar nenhum.
Me quebrei neste instante. Fragmentada encerro o falar sobre o sétimo dia apenas ressaltando que detesto as coisas pela metade. Sou exagerada e imprecisa. E amo. Amo muito.

quinta-feira, 16 de abril de 2009

.: Dia sexto:.

Os inexpressivos gestos teus são agressões gratuitas ao mundo. Eu acho que o mundo nos ama, mas quem disse que interessa o que eu acho? Tenho ficado doente das mazelas da exatidão, dos crimes da razão, e de leis que nos impomos. Não tenho sido a mesma que já tocou o alto do mais alto céu. O além para o infinito. O além do mais alto infinito... que por um instante, apenas um instante tocou. Ela, que não mais tenho sido, tem chorado em azulejos frios, secos e ríspidos azulejos. Ela, que de mim tem saído, a correr sem cabresto ou luz, sem lanterna ou aconchego, em inquietação de incompletude. Às vezes penso que ela precise de mim. Por instantes nos tocamos, temos calor e olhos ardentes, temos luz, temos tudo mais que não se pode nomear. Somos infames, não temos limites de páginas. Não temos tudo. Possuímos única e exclusivamente o nada, exatamente como se imagina por aí. Que cor é o teu nada?
Barulho. É só barulho o que faço. É só um sussurro o que escutam. Quando escutam. O que dou para o mundo ele devolve. Ocupo tanto espaço assim?
Estou cansada de não chegar. De não caber. De não querer sorrir. A indiferença, em qualquer instância também me agride. Alguma inflexão? Alguma inferência? Diga-me... Não me importo... este espaço é meu. Letra morta. Talvez brilhe quando algum ler. Entenda como queiras: os pedaços, o espaço, o vazio... aos pedaços. Me sinto uma folhinha ao vento. Uma estupidez qualquer dita numa tardinha de abril, debaixo de chuva rala, com os olhos aflitos e as questões boiando como espuma no mar.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

.: Dia quinto :.


Hoje é quarta, o quinto dia. Estou à beira de um desmaio vonluntário. Provocado. Um desmaio para assombrar os mais insanos delírios. Um desmaio. Em outras mais palavras: acordar para dentro. Mais como acordo do que outro sentido. Mais inefável que qualquer que seja o outro sentido.
Inefável. Adoro essa palavra. Tensiono com as mãos, com os pés, com as costas, com os lábios, tensiono, pretendo livrar-me: acho que é daí que vem a palavra livro. Livro que vem de livrar-se de algo morto e sufocante. É ruim escrito assim? Pois bem, tentemos novamente: Livro que vem de livre, de se ver livre em todas as possibilidades. Ficou mais leve? Ficou mais belo? Talvez.
A imagem acima requer alguma explicação? Ótimo. Não sou eu, só uma projeção do que eu seria se minha pessoa fosse palpável, tangível... me toca? Sim. Ela me toca por demais, tem um je ne sais quoi. Adoro essa expressão francesa que resume a nada algo tão especial. Especial é uma expressão vaga, fraca, tossindo e com asma. Mas eu gosto, e daí que eu goste? Me espanta.
Hoje, no dia quinto me dei conta de que vivo em fragmentos, nessas novas filosofias mesmo, fragmentada, em inúmeros pedaços indecifráveis, em vapores, em suspiros, em tonturas e dores. Quebrada em partes que nunca irão se juntar, em partes que, quando completas, não trazem satisfação...
Vivo me questionando, verde, imatura, inconstante e me refazendo. Hoje é quarta, o quinto dia, e cinco é meu número de sorte. Voilá!

terça-feira, 14 de abril de 2009

.: Dia quarto :.

Bem quarto mesmo. Ontem fui acordar para dentro com vontade de desenvolver um livro, uma história dessas com personagens e tudo. Aí me dei conta que essas histórias só ficam boas quando elas são vividas, e esses personagens são nossas personas maravilhosas que brilham todos os dias. Tenho cola nos meus dedos. Estava brincando de colar papel indagora. Sim, brincando mesmo, de bobeira maternal, feliz da vida.
Essas páginas são diários, ensaios para poesias. Esses textos são em tom sofrido, e espero, ah eu espero, que eles saiam andando por aí assim, bem por aí assim, displicentemente, como dança. Cansei dessas metáforas e comparações de leve, vou esmurrar minha cara para entrar no tal livro com sangue no olho. Quero um livro brutal. Que dilascere os sentidos. O problema é o vivido que anda pairando.
Hoje, no quarto, dia, fico assim pensando em tudo, acho que todo dia é assim, navego em possibilidades terríveis e fico quase chorando de imaginar catástrofes acontecendo comigo, fico dolorida de tiros imaginários e cansada de dançar. Às vezes eu canto pra espantar essas loucuras. Mas prefiro mudar o rumo das histórias, tipo maravilhas. Ontem naveguei na morte. De saber que tudo nos leva à solidão de uma cova, uma pira, ou o que quer que seja e que nascemos em grito poderoso e solitário. Rituais poéticos à parte, creio que nem no desespero de antigas mulheres ao se jogarem na cova com os maridos, ou de Romeu, ao se matar na morte de Julieta, nem mesmo isso pode conferir uma companhia para a morte. Não sei nem com que ciência falo dela, afinal de contas perdi poucos nessa vida, e o que sei é que vou morrer, talvez seja preparação, ou terapia.
Cansei de escrever, e estou sem rumo nessa escrita. Preciso é de poesia. Talvez beber alguma coisa e conversar sem limites com alguém.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

.: Dia terceiro :.

Estou ouvindo tudo pela metade. Meio amargo, eu penso.
Nunca me escondi de nada, não temo quase nada, e até gosto de ver e ser vista de vez em quando. Tudo meio. Caminhei muito... a noite inteira e hoje percebi que não preciso ficar passeando por aí em busca de nada. Preciso parar. Preciso sumir de todo mundo que me veja. Não posso suportar a demasia. Não agora. Não hoje. Certas coisas não nasceram para mim. Estou existencialista hoje. Estou em tontura abissal, vou girando, espirais de medo, talvez um tango, ou uma dança latina qualquer, vou cair... será labirintite?
Estou escutando quase nada. E meus sonhos se derreteram feito sorvete no sol de minha cidade... meu riso ficou dolorido hoje. O que se há de fazer?
Gosto de não ser vista, também. Por isso deixo tudo à mostra, fica mais fácil de notar, mais fácil de tremer o futuro.
Se eu fosse um tecido, ou folha de papel, já teria me rasgado de tanto me repuxar em todas as direções...

Je t'aime d'amour! Eu digo e fujo.

segunda-feira, 6 de abril de 2009

.: Dia segundo :.

Mania de seguir caminhos que não são meus. De reler anseios exagerados que já se foram. De ser romântica mas não fatalista. Me deixei levar pela falta de tato. Pelos olhos apertados de tanto se fecharem... pelos dias que não me pronuncio.
Não tem nenhum sentido escondido aqui. Fica tudo muito óbvio quando de dentro de mim se me olha. O cheiro da chuva inebria o cheiro de flor. E todos bêbados vão bailar em nome de Dionísio. Em nome de Afrodite. Em cima dos nomes cheios de luz.
Estou fragmentada no dia segundo. Entro e saio das palavras quando deveria reconstruir de onde parei, a antiga história mal resolvida, que possivelmente não virará livro. Eu não prefiro ser como você.
O sangue pulsa no decorrer do sentido. Na verdade ele escorre em formato de margarida: é possível? Abra o sentido, destrua a percepção... se há momentos onde o improvável ocorre, não tente transformar o sentido em razão já conhecida. Simples: onde um cão fala, o sangue pode escorrer em formato de margarida, e poderemos voar por sobre o mar e gatos sempre desvendarão meus olhos negros...
Acredito seriamente no discurso repetido. É ritual, e todo rito tem poder quando refeito em seu original ritmo. Cante para mim todos os dias, e nunca vou deixar de me apaixonar.
O gosto de orvalho do mar ainda existe em mim. E vai persistir, posto que é só meu.

sábado, 28 de março de 2009

.: Dia primeiro:.

Foi muito bom voar e ver o mar. Tocar o ar. Sentir o céu.
Mais um texto existencial aqui se permite e eu não me perco nas divagações. Sei que não me perco. Poucas vezes me perco. às vezes me perco. Me perco. Sempre. Quase. Tanto. Cada vez mais tenho pensado em desistir de tudo. No sentido mais estúpido é claro. E não me sinto estúpida por isso: são minhas entranhas que se reviram e revidam cada golpe recebido. Vou procurar o infinito. Cansada demais da sensibilidade. Do choro, do exagero, da dor, da realidade. Talvez em cinco minutos eu desmaie... Quero uma blusa branca, um vestido com flores bordadas. Quero milhares de sorrisos comigo. Quero a sorte, o fim e o princípio. O que eu quero é o que não pode ser desejado. Estou intensa. Tensa. Estou quase no fim. Ou imaginando limites estranhos. Muito barulho por nada. Muito nada. Muito espaço nas entrelinhas. Quero agarrar uma estrela, um suspiro. Estuprar uma cor e fazer uma aberração. Os vampiros me perseguem em todas as esquinas... meu rosto vai ser mascarado em instantes.
O cantar do princípio é o mesmo. Mas já não é mais princípio. Só se detém o poder no ritmo do canto primordial. Avisei que não me perco. Me canso. Estou faminta e nada se parece com comida. Entropia. Libertação. Medo. Susto. Negação. Choro. Mais choro. Choro demais: quando estou feliz, quando estou triste. Choro de raiva e desespero. Eu necessito explodir quase sempre. Eu sempre preciso explodir. As palavras não se mostram. Necessidade não é talento. Meus olhos estão pesados e eu não sei o que espero. Minhas metades pelo mundo: atrasadas, adiantadas, meus pedaços falidos... como os amo! As letras crescem nesse manuscrito estranho... Vou escrever assim, como cartas... datadas e envelopadas. Todos os meus dias de mangue. Não precisa ler. Talvez não passe dessa carta. Sou uma mulher de palavras. Extensas, intensas... Sou comum. Sou qualquer uma. Só não sou e nunca serei você. Pode rir da minha falta de sentido, eu possuo todos os outros sentidos nessas explosões traiçoeiras. Não vou mais disfarçar o que sinto em dizer. Tenho febre quando escrevo assim. As palavras, as imagens, o mundo se prende em meus cabelos e não cai pela tinta de mesma cor.
Ah sim. Existem mundos que nunca serão meus. Existe um abismo que não quer fechar, um grito que não vai sair, uma eternidade em que vou me resignar. O silêncio também não está à altura da grandeza dos momentos. Não diga nada meu amor. Os dias são nulos quando não exagero. Os dias são poucos. Eu exagero para que sejam suficientes............. Eu não sei manipular. Eu sei de nada. Eu sei de muito nada. A língua autêntica aqui se manifesta: fatores que me provocam. Dias que me prometem, me fuzilam todos eles... O que te lê? Sou vazia. Por isso tanto expresso, tenho que preencher meu vazio. É na verdade um espaço enorme. Não sou de todo vazia.
Essas palavras precisam ser ditadas, lidas em alto e bom som: todos os tons, enigmas de meu desespero, ironias que me depreciam. Sempre me deprecio nas horas vagas. E sou livre aqui. Não me importa a repetição e o vazio desse grito. Estou mesmo gritando o meu vazio, o meu não-viver, sou recém-nascida, e esse grito é anúncio! Tenho sede. Tenho dor em demasia.